ADUR Online #8: O Rio de Janeiro e a tempestade perfeita: notas maquiavelianas sobre o presidencialismo de coalizão na era Bolsonaro
25 de setembro de 2020
ADUR ONLINE*
Por: Bruno Cecchetti e Mayra Goulart¹
Nicolau Maquiavel, indefectível patriarca da Ciência Política e sábio conselheiro de governantes alertava, já no século XV, sobre as relações entre virtú e fortuna, enquanto determinantes para a manutenção e expansão do poder político. Entendendo a fortuna como a sorte ou azar que determinada conjuntura deslindava àqueles que sobre ela se lançavam, a virtú aparecia como a arte de, analisando-a em seus desafios e oportunidades, traçar rotas de ação capazes de corrigir os rumos, deixando moralismos e princípios de lado e adaptando as estratégias para melhor compatibilizá-las aos revezes do destino. Não há melhor exemplo para entender um lance da fortuna do que a pandemia de Covid-19. Diante disso, nosso objetivo ao longo desse texto será comparar, a partir do conceito de virtú, as performances de três governantes ao longo deste novo contexto de crise global. Deste modo, seguindo os passos do florentino, os príncipes aqui escrutinados serão Jair Bolsonaro, Wilson Witzel e Marcelo Crivella, que, embora tenham adotado diferentes posicionamentos discursivos acerca da pandemia, compartilham o descaso com a saúde pública e a tentativa de utilizá-la para desviar o foco das acusações de corrupção que enfrentam. Reconhecendo as singularidades de cada caso, nos interessa entender como esses atores empregaram sua virtú (ou a ausência dela) na adaptação de suas estratégias aos reveses que a fortuna lhes apresentou. No nosso entendimento, todavia, essa adaptação passa por uma atualização de dinâmicas deveras tradicionais da política brasileira, denominadas pela literatura especializada através do conceito de presidencialismo de coalizão.
Presidencialismo de coalizão é o termo cunhado por Sérgio Abranches (1988) para designar dinâmicas de formação de maiorias parlamentares pelo presidente através da distribuição de cargos e recursos aos partidos aliados. Num regime presidencialista como o brasileiro, o Poder Executivo não depende necessariamente de uma maioria estável no Legislativo para ser eleito, ou mesmo, para governar, como o seria no caso de sistemas parlamentares. Não obstante, para garantir a chamada governabilidade, isto é, aprovação da agenda do governo e a estabilidade política para manter-se no cargo, é importante que haja receptividade por parte do Legislativo, o que, conforme indicado na formulação de Abranches, depende uma lógica de negociação de cargos ministeriais em troca de apoio legislativo ao presidente.²
Consideramos um uso atualizado do conceito, pois, na era Bolsonarista os determinantes centrais dessa articulação deixam de ser os partidos e a formação de um arco de alianças estável no Legislativo. As negociações de cargos e recursos aos deputados em troca de apoio aos projetos do Executivo, passam a ser feitas diretamente com os parlamentares, sobretudo aqueles que exercem ascendência sobre os demais. O resultado são alianças menos programáticas, mas, também, menos estáveis, posto que sempre pontuais. Em outros termos, a governabilidade deixou de ser resolvida no atacado e passou a ser negociada no varejo, caso a caso, deputado por deputado, votação por votação. Não é preciso lembrar ao leitor que compras no varejo são sempre mais caras, ou seja, nessa nova política as articulações entre Legislativo e Executivo comprometerão ainda mais o já engessado orçamento público. Tendo isto em conta, iremos esboçar algumas considerações acerca dos impactos dessa episteme bolsonarista de negação da política e rejeição dos mecanismos de articulação tradicionais entre os Poderes. Para isso, além do âmbito federal, iremos nos ater às agruras do Rio de Janeiro, com o propósito de observar as diferenças entre nosso príncipe municipal, mais próximo do bolsonarismo e de suas estratégias, e estadual, para quem a rejeição ao toma lá da cá teve consequências mais drásticas.
Em 2018, Jair Messias Bolsonaro foi eleito presidente da República com uma campanha combativa, comprometida a acabar com o “toma lá dá cá”, termo pejorativamente utilizado para designar as dinâmicas consagradas pelo conceito de presidencialismo de coalizão. O então candidato, inclusive, acusou Geraldo Alckmin, que concorria pelo PSDB, de ter se aproximado com “o que há de pior no Brasil” – em alusão a um encontro com representantes do Centrão, segmento fisiológico e incontornável do Legislativo, devido a quantidade de cadeiras que ocupa.³ Na altura, o bloco formado por DEM, PP, PR, SD e PRB decidiu apoiar o pré-candidato tucano. O discurso antipolítico e anti-sistema manteve-se relativamente firme em 2019. Reafirmando sua ojeriza à lógica partidária, Bolsonaro sai do PSL, alegando falta de transparência do partido com o dinheiro público, de acordo com Karina Kufa, sua advogada.4 O ano de 2020 e o advento da pandemia, contudo, trouxeram imperativos da fortuna que precipitaram uma virtuosa correção de rumo nas estratégias de Jair Bolsonaro frente à Presidência da República.
Já nos primeiros meses, o presidente começava a perceber seu desgaste político, acentuado pela repercussão de sua participação em ato com manifestações antidemocráticas no dia 15 de março que pediam fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF) em meio a pandemia, rompendo o isolamento social que já estava em vigor em Brasília.5 No dia 7 de maio, 36 pedidos de impeachment já haviam chegado à mesa do presidente da Câmara,6 enquanto sua chapa estava sendo investigada pelo TSE.7 Em junho, auge da crise sanitária e política, as taxas de reprovação do presidente alcançaram 50%.8
Diante desses desafios e premido por sucessivas derrotas no Legislativo como a derrubada dos vetos presidenciais à Lei de Abuso de Autoridade e o aumento do fundo eleitoral,9 Bolsonaro segue a cartilha maquiaveliana, corrigindo rumos e dobrando a aposta na sua atualização dos mecanismos do presidencialismo de coalizão. O turning point foi operado mediante a aceleração do varejístico loteamento de cargos do primeiro e segundo escalão da administração pública para membros do até então maldito centrão – indicados pelos seus líderes Arthur Lira (PP-AL), Wellington Roberto (PL-PB), Valdemar Costa Neto e entre outros nomes alçados à posição de peças-chave do governo.10
Bem sucedido em sua estratégia, Bolsonaro nos servirá de parâmetro para analisarmos as conjunturas subnacionais, em especial a do Rio de Janeiro. No campo estadual temos Wilson Witzel, estreante na política e ex-bolsonarista de ocasião. O governador, atualmente afastado por decisão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), ao que tudo indica será o primeiro a ser impeachmado na história do estado, acusado na Operação Placebo por desvio de recursos destinados ao combate à pandemia através de orçamentos fraudados. De acordo com a Polícia Federal (PF), haveria fortes indícios de um esquema de corrupção envolvendo uma organização social, o Instituto de Atenção Básica e Avançada à Saúde (Iabas), contratada para a instalação de hospitais de campanha, e servidores da cúpula da gestão do sistema de saúde estadual. Tudo isso com amplo conhecimento do governador.11
Eleito com um discurso crítico ao presidencialismo de coalizão e sem o estabelecimento de qualquer arco de alianças no Legislativo, Witzel contava apenas com o apoio precário dos deputados Márcio Pacheco e Chiquinho da Mangueira, membros do seu partido, o PSC – ambos protagonistas de um episódio que ilustra a desfavorável situação do nosso príncipe junto à Alerj.
Em entrevista à Globo,12 Márcio Pacheco afirmou que, por ser o único membro da legenda do governador, Chiquinho da Mangueira havia sido preso na operação furna da onça,13 tendo sido premido a abdicar de sua candidatura à Presidência da Alerj e apoiar a de André Ceciliano (PT) a fim de garantir governabilidade. A manobra desagradou os deputados do PSL que seriam ideologicamente mais próximos de Witzel, afastando-os.
Não satisfeito com sua impopularidade entre as elites políticas cariocas, Witzel demonstrou-se um príncipe sem virtú ao implodir suas bases de apoio junto ao governo federal em uma jogada que lhe custou o pouco de simpatia que os segmentos bolsonaristas da sociedade ainda lhe emprestavam. Quanto a isso, Witzel nem mesmo pode culpar a fortuna (pandemia), posto que a infeliz decisão de se anunciar como pré-candidato à Presidência da República ocorreu ainda em 2019.
No dia 26 de março, em entrevista publicada na Folha de São Paulo, Witzel reconheceu que a fala do presidente em pronunciamento oficial no dia 24 de março foi um desastre.14 Porém, logo em seguida, no dia 6 de abril, João Dória (PSDB), em entrevista coletiva no Palácio dos Bandeirantes, pediu aos brasileiros para que não seguissem as recomendações do Planalto, em uma decisão referendada por Witzel que, a princípio, trouxe-lhe alguma popularidade.15 No dia 8 de abril, o Datafolha relatou um aumento na aprovação dos governadores Dória e Witzel em seus estados, 51% e 55% respectivamente, enquanto a aprovação do presidente era de 28% em São Paulo e 34% no Rio.16 Em reunião ministerial ocorrida em 22 de abril e divulgada em 22 de maio, por decisão do ministro do STF Celso de Mello, vimos o presidente furioso, a ponto de chamar Dória de “bosta” e Witzel de “estrume”.17
A resposta de Bolsonaro à deslealdade de Witzel foi rápida, afinal tratava-se de um governador com bases sociais e políticas mais precárias do que as de seu homólogo paulista. Em 26 de maio, após a Polícia Federal investigar endereços ligados ao governador, inclusive no Palácio das Laranjeiras, Witzel fez um pronunciamento no qual declarou que estaria sendo vítima de perseguição política por ser considerado inimigo do presidente. Para Dória, a operação da PF contra seu colega indica uma escalada autoritária por parte do governo de Bolsonaro, alegando como indício da influência de Bolsonaro nas investigações contra Witzel, o fato de que a deputada Carla Zambelli (PSL-SP) teria antecipado a operação em entrevista à Rádio Gaúcha no dia 25 de maio18 – além da comemoração do presidente ao ser comunicado das mesmas.19
O governador não agiu com virtú no estabelecimento de laços com a Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro (ALERJ). No entanto, ao observar a rápida deterioração de sua situação, tentou operar uma correção de rumos, análoga a de seu recém-desafeto. Nesse contexto, Witzel demite Lucas Tristão, seu braço direito. Ex-secretário de Desenvolvimento Econômico, Energia e Relações Internacionais e também investigado na operação placebo, Tristão era um desafeto na casa legislativa e foi substituído por Marcelo Lopes da Silva, até então procurador-geral do RJ .
De acordo com André Ceciliano, Lucas Tristão prejudicou a já frágil relação entre o Executivo e o Legislativo fluminense, ao tentar desestabilizar os parlamentares, ameaçando-os com supostos dossiês de informações acerca dos 70 deputados e, posteriormente, tentando comprá-los como jujubas – em alusão à afirmação proferida em público de que poderia adquiri-los em toda esquina.20 Ainda na tentativa de recuperar prestígio com os deputados, Witzel tentou distribuir secretarias, além de renomear como Secretário da Casa Civil o recém-exonerado André Moura (PSC), ex-líder do governo Temer, tido como um dos articuladores responsáveis por evitar o avanço dos processos de impeachment contra o então presidente. Também cessou ataques a Bolsonaro e indicou estar disposto a colaborar com o governo federal, manifestando seu desejo de ir a Brasília celebrar as pazes por meio de uma reunião no gabinete presidencial. A manifestação foi ignorada e o convite jamais foi feito. Do mesmo modo, os esforços de aproximação com a ALERJ não prosperaram. Em junho, André Ceciliano (PT- RJ), realizou uma votação simbólica para decidir se daria abertura ao processo, na qual 69 deputados votaram a favor, incluindo o líder do PSC. Apenas Rosenverg Reis (MDB-RJ) não votou por ter faltado à sessão virtual.
Em 28 de agosto, é deflagrada a Tris in Idem, um desdobramento da Operação Placebo, Wilson Witzel é afastado do cargo por 180 dias devido a uma decisão monocrática (e questionável) do Supremo Tribunal de Justiça. A despeito da fragilidade jurídica da ação de Benedito Gonçalves, uma pesquisa de popularidade realizada pelo Instituto Paraná para a Revista Veja, revelou que 79,1% dos entrevistados eram a favor do impeachment. No dia 17 de setembro, a comissão especial, composta por 24 deputados de partidos de diferentes espectros ideológicos, que analisa o pedido, votou unanimemente pela continuidade do processo. Em 23 de setembro, a Alerj aprovou por unanimidade o afastamento do governador que ainda será julgado por um Tribunal Misto formado por cinco deputados eleitos pela Assembleia e cinco desembargadores sorteados entre os 180 do Tribunal da Justiça, que julgará se houve crime de responsabilidade. Após a formação, o Tribunal tem até 120 dias para concluir o processo de crime de responsabilidade.21
Diferentemente do príncipe fluminense, o prefeito do Rio, Marcelo Crivella (PRB), não pode ser considerado um debutante no baile da política, já tendo dançado com diferentes parceiros à esquerda e à direita.Ao contrário do governador, um juiz acostumado a decidir consultando apenas a própria consciência, Crivella é um político tradicional, forjado no calor das negociações. Seguindo de perto os conselhos de Maquiavel, foi capaz de manter-se próximo daqueles que ocupam o poder.
Senador eleito pelo PL em 2002 e reeleito em 2010 pelo PRB, Crivella deixa a Câmara Alta em 2012 para exercer o cargo de ministro da Pesca e da Aquicultura no governo Rousseff, do qual se afasta em 2014 após reforma ministerial levada a cabo pela presidenta. Retornando para o Senado, nosso dançarino ali permanece até abandonar o cargo novamente, ao ser eleito prefeito do Rio de Janeiro em 2016. Nas eleições de 2018, Crivella não declarou apoio a nenhum candidato, mas seus bailes com partidos de esquerda já haviam se encerrado no período do golpe de 2016, quando todos os 22 deputados do PRB, partido do prefeito, votaram a favor do impeachment da presidenta,22 apesar do apoio do PT à candidatura de Crivella a governador em 2014 no segundo turno.23 Crivella, no entanto, deixou claro sua aproximação ideológica com o, na época recém eleito, presidente ao dizer que “a força de Bolsonaro é a preservação da família”.24
Em março de 2018, antes do primeiro pedido de impeachment, o Datafolha anunciou um salto na rejeição à gestão Crivella, de 61%, em março de 2018, para 72% em dezembro de 2019.25 Demonstrando ter aprendido as lições do mago florentino, Crivella capitaneia uma aproximação com o PSL e com a família Bolsonaro, juntamente com o auxílio de Edir Macedo, líder da Igreja Universal do Reino de Deus, mas a negociação não foi à frente em virtude dos embates entre Luciano Bivar (PE) presidente nacional do partido e o presidente da República.26 Em março de 2020, Flávio e Carlos Bolsonaro se filiam ao PRB após abandonarem o PSL em novembro de 2019.27 O prefeito comemorou a aquisição do partido em sua rede social.28
Em dezembro de 2019, Crivella gravou um vídeo em defesa do senador Flávio Bolsonaro, investigado pelos crimes de lavagem de dinheiro e peculato, reafirmando, seus laços com o bolsonarismo e o rompimento com Witzel, que planejava lançar um candidato próprio.29 A lealdade com a famiglia presidencial tem sido devidamente recompensada. Em 16 de janeiro, Bolsonaro saiu em defesa do prefeito ao comentar um dos muitos escândalos de sua administração na área da saúde: “Ele [Crivella] diz lá que a Globo, por exemplo, o tempo todo diz que a Saúde não funciona no Rio. Ele comprovou que funcionava com atendimentos [médicos]. […] A gente lamenta, porque a Globo não faz trabalho contra o prefeito, faz contra o povo do Rio de Janeiro”.30 Em julho, Crivella também apareceu ao lado filho mais velho do presidente em um evento da Polícia Rodoviária Federal onde o prefeito até efetuou disparos contra um alvo e afirmou ter sido militar.31 Quando o Jornal Globo denuncia o caso dos “Guardiões do Crivella” em meio a crise de saúde do município, Flávio postou um vídeo em defesa do prefeito.32
Nosso príncipe, portanto, tem sido bem sucedido em seus esforços para a manutenção de suas bases junto à população e ao legislativo, agregando evangélicos e bolsonaristas. Sua virtú, todavia, não lhe blindou dos reveses da fortuna. É o caso de mencionar o episódio de 2018, que ficou conhecido como “Fala com Márcia”, em virtude do vazamento de uma gravação do prefeito, reunido com líderes religiosos sugerindo que façam contato direto com a funcionária pública responsável pelos agendamentos, para obter favorecimento nos mesmos. O escândalo resultou em um processo de impeachment. Outro episódio, conhecido como “Guardiões do Crivella” veio à tona no final de agosto deste ano, quando funcionários comissionados da Prefeitura eram desviados de suas funções e se organizavam em grupos de WhatsApp, juntamente com o prefeito, a fim de intimidar jornalistas e constranger cidadãos que viessem a criticar o serviço, como mostra a reportagem da TV Globo. Diante deste último escândalo, reafirmando sua aliança com o governo federal, Crivella insinuou que esse era um ataque voltado ao presidente, uma vez que sua possível reeleição no Rio seria o primeiro passo para a reeleição de Bolsonaro.33
Dos cinco processos de impeachment em curso na ALERJ contra Crivella, somente um passou da primeira das duas votações, o que revela a virtú do prefeito na manutenção, ainda que instável, de um arco de apoio junto ao Legislativo e ao eleitorado, sobretudo quando comparado com seu homólogo em nível estadual. O único processo de impeachment contra Crivella que passou do primeiro turno de votação foi o de improbidade administrativa,34 envolvendo concessões sem licitação a empresas de publicidade, que envolviam a autorização do uso de locais públicos que pouparam R$30 milhões em obrigações e multas, de acordo com o contrato. No segundo turno, votaram a favor do impeachment PSOL, PT, PDT, PSC e PSDB; votaram contra MDB, PRB, DEM, PSC, PMN, PSD, PSDB, PP, PHS, PTB, Avante, Novo, Podemos, PDT e PRTB, o que nos permite demonstrar a amplitude de suas alianças no Legislativo que envolvem partidos de diferentes posicionamentos ideológicos.
Contudo, apesar de conseguir se mobilizar para conquistar votos suficientes para manter-se no cargo, o prefeito não contava com a contínua ação da fortuna. A primeira, movida pela denúncia apresentada pela coligação PT/PCB35 de que teria praticado abuso de poder político em um evento com funcionários da Comlurb, destinado a pedir apoio eleitoral ao próprio filho e outros candidatos do PRB nas eleições de 2018. A segunda consiste em uma denúncia, apresentada pelo PSOL e pela Procuradoria Regional Federal (PRE),36 ainda sobre o episódio “Fala com a Márcia” em que o prefeito garantia agilizar a espera por cirurgia de catarata para fiéis e oferecia a quitação do IPTU atrasado de pastores evangélicos.37 As duas denúncias iniciadas em 2018, foram levadas ao Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ) tendo sido avaliadas no dia 21 de setembro. Dos sete desembargadores que analisaram o processo, cinco acompanharam o voto do relator, Cláudio Dell’Orto, a favor da inelegibilidade acompanhada de multa. Não obstante, como o desembargador Vitor Marcelo Aranha pediu vista, a votação foi interrompida e, apesar da maioria já estar estabelecida, ainda caberá recurso por parte do réu, o que provavelmente protelará a decisão sobre sua inelegibilidade para um período posterior ao das próximas eleições municipais.38
Nesse brevíssimo comentário sobre a conturbada dinâmica entre Legislativo e Executivo tentamos abarcar as três esferas federativas (união, estado e município), comparando à luz das noções de virtú, fortuna e do conceito de presidencialismo de coalizão, as estratégias de Jair Bolsonaro, Wilson Witzel e Marcelo Crivella. Ao comentar o impeachment de Dilma Rousseff, Wendy Hunter e Timothy Power (2019), utilizam a expressão tempestade perfeita para se referir à conjunção de quatro crises: econômica, política (descrença nos partidos tradicionais), corrupção e de segurança pública. O Rio de Janeiro é caso exemplar dessa conjunção, justificando-o como objeto de análise, posto que qualquer estabilidade nesse contexto demanda particular virtú por parte dos envolvidos. Neste esforço, utilizamos como parâmetro os exitosos esforços de recomposição do bolsonarismo em nível nacional, sobretudo no contexto da pandemia. Ao aproximar-se do centrão e recuperar sua popularidade encampando uma agenda distributivista, Bolsonaro demonstrou-se um líder de virtú, capaz de adaptar-se aos revezes da fortuna, corrigindo suas estratégias iniciais. Sob essa chave maquiaveliana fica claro o flagrante insucesso de Wilson Witzel, cuja demora em abandonar uma estratégia inicial de inflexibilidade e desvalorização do papel do Legislativo lhe custará, ao que tudo indica, o cargo. Crivella, ao contrário, ao superar diferentes escândalos e contornar sucessivos processos jurídico-políticos, surge como caso intermediário, cuja inequívoca virtú é desafiada pela fortuna de governar um município particularmente fragilizado por uma tempestade perfeita que já dura algumas décadas.
Referências
[1] Respectivamente, graduando e professora do curso de Ciências Sociais da UFRRJ, pesquisador e coordenadora do Laboratório de Partidos Eleições e Política Comparada (LAPPCOM) http://ppgcs.ufrrj.br/laboratorios-de-pesquisa/lappcom/.
[2] ABRANCHES, Sérgio Henrique. Presidencialismo de Coalizão: O Dilema Institucional Brasileiro. Rio de Janeiro, Dados, Revista de Ciências Sociais, 1988. Outros estudos sobre presidencialismo de coalizão usados como referência: SANTOS, Fabiano Guilherme Mendes; ALMEIDA, Acir. Fundamentos informacionais do presidencialismo de coalizão. Curitiba, Editora Appris, 2011. e FIGUEIREDO, Argelina Cheibub e LIMONGI, Fernando. Política Orçamentária no Congresso Nacional: ontem e hoje. Blog DADOS, 2019 [published Sep 2019]. Available from: http://dados.iesp.uerj.br/politica-orcamentaria-no-congresso-nacional-ontem-e-hoje/
[3] https://valor.globo.com/politica/noticia/2018/07/22/bolsonaro-diz-que-alckmin-se-cercou-do-que-ha-de-pior-com-centrao.ghtml
[4] https://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2019-10/psl-deixou-de-ser-transparente-diz-advogada-de-bolsonaro
[5] https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2020/03/15/sem-mascara-no-planalto-bolsonaro-elogia-atos-pelo-brasil-nao-tem-preco.htm
[6] https://www.bbc.com/portuguese/brasil-52569194
[7] https://www1.folha.uol.com.br/poder/2020/05/barroso-assume-tse-em-meio-a-acoes-que-miram-chapa-bolsonaro-mourao.shtml
[8] https://www.poder360.com.br/poderdata/41-aprovam-e-50-desaprovam-governo-bolsonaro-diz-datapoder360/
[9] https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2020/08/14/interna_politica,1176160/bolsonaro-e-o-presidente-com-mais-vetos-derrubados-pelo-congresso.shtml
[10] https://www.brasildefato.com.br/2020/05/29/por-que-bolsonaro-busca-alianca-com-centrao-grupo-que-considerava-o-que-ha-de-pior
[11] https://www.gazetadopovo.com.br/republica/placebo-witzel-governador-operacao-rio/
[12] https://oglobo.globo.com/rio/unidos-lider-do-governo-witzel-apoiara-andre-ceciliano-para-presidencia-da-alerj-23353800
[13] https://oglobo.globo.com/rio/unidos-lider-do-governo-witzel-apoiara-andre-ceciliano-para-presidencia-da-alerj-23353800
[14] https://www1.folha.uol.com.br/poder/2020/03/ministro-confunde-e-bolsonaro-tem-que-voltar-a-tv-e-desfazer-o-que-fez-diz-witzel.shtml
[15] https://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/2020/04/citando-moro-guedes-e-mourao-doria-anuncia-quarentena-por-mais-15-dias-em-sp.shtml
[16] https://www1.folha.uol.com.br/poder/2020/04/doria-e-witzel-tem-melhor-aprovacao-do-que-bolsonaro-na-crise-diz-datafolha.shtml
[17] https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/05/22/bolsonaro-chama-doria-de-bosta-e-witzel-estrume-durante-reuniao-ministerial-veja-video.ghtml
[18] https://valor.globo.com/politica/noticia/2020/05/26/doria-v-escalada-autoritria-de-bolsonaro-em-ao-contra-witzel.ghtml
[19] https://noticias.uol.com.br/colunas/leonardo-sakamoto/2020/05/26/critico-a-apuracao-sobre-flavio-bolsonaro-da-parabens-quando-atinge-witzel.htm
[20] https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/2020/06/16/ceciliano-diz-que-governo-do-rio-ofereceu-quase-todas-as-secretarias-por-apoio
[21] https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2020/09/23/alerj-aprova-continuidade-do-impeachment-de-witzel-e-autoriza-processo-por-crime-de-responsabilidade.ghtml
[22] Para conferir voto dos deputado federais: https://www.camara.leg.br/noticias/485947-camara-autoriza-instauracao-de-processo-de-impeachment-de-dilma-com-367-votos-a-favor-e-137-contra/ Para conferir voto dos senadores: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2016/12/28/veja-como-votaram-os-senadores-no-julgamento-de-dilma-rousseff
[23] http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/eleicoes/2014/noticia/2014/10/pt-rj-anuncia-apoio-candidatura-de-marcelo-crivella.html
[24] https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/politica/2018/11/23/interna_politica,721067/a-forca-de-bolsonaro-e-a-preservacao-da-familia-diz-crivella.shtml
[25] https://www1.folha.uol.com.br/poder/2019/12/bolsonaro-diz-gostar-de-crivella-mas-evitar-declarar-apoio-a-ele-para-2020-no-rio.shtml
[26] https://www1.folha.uol.com.br/poder/2019/10/crivella-quer-acordo-com-bolsonaro-para-dar-a-vice-ao-psl-na-busca-pela-reeleicao.shtml
[27] https://www1.folha.uol.com.br/poder/2020/03/filhos-de-bolsonaro-flavio-e-carlos-se-filiam-ao-republicanos-partido-de-crivella.shtml
[28] https://twitter.com/MCrivella/status/1243604443226136576
[29] https://catracalivre.com.br/cidadania/crivella-posta-video-de-apoio-a-flavio-bolsonaro/
[30] https://www.poder360.com.br/governo/crivella-comprovou-que-saude-do-rio-funciona-diz-bolsonaro/
[31] https://veja.abril.com.br/politica/para-atrair-eleitor-de-bolsonaro-crivella-da-ate-tiro-de-fuzil-e-pistola/
[32] https://www.instagram.com/p/CEy4CK4pas0/
[33] https://vejario.abril.com.br/beira-mar/crivella-querem-atingir-bolsonaro-guardioes/
[34] Um processo de impeachment de um prefeito se dá em 5 etapas: 1- é a denúncia de crime de responsabilidade, que deve ser acatada pelo presidente da câmara dos vereadores, que 2- abre o primeiro turno de votação, que precisa de metade dos vereadores para o pedido ser acatado. Se acatado 3- é criada uma comissão especial, feita de vereadores normalmente selecionados por sorteio, que investigará a denúncia e julgará se houve ou não crime de responsabilidade. 4- simultaneamente aos trabalhos da comissão especial, é dado ao prefeito um prazo para se defender da acusação, a defesa deve ser ouvida antes da decisão da comissão ser tomada. Após a defesa, se a comissão for favorável ao impeachment, é aberta 5- a segunda votação, nela o pedido de impedimento só será efetivado com a aprovação de 2/3 dos vereadores da casa.
[35] https://www.conjur.com.br/2020-ago-12/mp-eleitoral-crivella-inelegivel-2026-abuso-poder
[36] https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2020/09/21/tre-rj-inicia-julgamento-de-pedido-de-inelegibilidade-de-crivella.ghtml
[37] https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/entenda-o-que-motivou-os-pedidos-de-impeachment-contra-o-prefeito-marcelo-crivella.ghtml
[38] A decisão do colegiado já deixa Crivella inelegível, contudo o prefeito ainda pode realizar a campanha enquanto não esgotar os recursos cabíveis com o TSE e STF.
*ADUR Online é um espaço da base do sindicato. As opiniões expressas no texto não necessariamente representam a opinião da Diretoria da ADUR-RJ.
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No dia 10 de abril, quarta-feira, aconteceu em Brasília a Reunião do Setor das Instituições Federais de Ensino do ANDES … leia mais
Inauguração da Exposição em Memória dos 60 Anos do Golpe Militar na Baixada Fluminense
Postado em 27/03/2024
A Rede de Educação Popular da Baixada Fluminense, em parceria com o Fórum Grita Baixada, Sepe Nova Iguaçu, Centro Cultura … leia mais
Entidades sindicais se reúnem com governo para discutir a reestruturação da carreira docente
Postado em 22/03/2024
Aconteceu no dia 15 de março a terceira reunião da Mesa Específica e Temporária dos docentes do magistério superior para … leia mais
8M | Protagonismo feminino no sindicato
Postado em 08/03/2024
Hoje, celebramos o Dia Internacional das Mulheres, uma data emblemática que nos convida a refletir sobre as conquistas femininas ao … leia mais